Words and life

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quarta-feira, 18 de maio de 2011

A Minha Dôr

Tua morte feriu-me no mais fundo, 
Remoto da minh'alma que eu julgava 
Já fóra desta vida e deste mundo! 

E vejo agora quanto me enganava, 
Imaginando possuir em mim 
Alma que fôsse livre e não escrava! 

Meu espirito é treva e dôr sem fim. 
Todo eu sou dôr e morte. Sou franquêsa. 
Sou o enviado da Sombra. Ao mundo vim 

Prégar a noite, a lagrima, a incertêsa, 
A luz que, para sempre, anoiteceu... 
Esta envolvente, essencial tristêsa, 

Tristêsa original donde nasceu 
O sol caindo em lagrimas de luz, 
Chôro de oiro inundando terra e céu! 

Sou o enviado da Sombra. Em negra cruz, 
Meu ilusorio sêr crucificado 
Lembra um morto phantasma de Jesus... 

E aos pés da minha cruz, no chão maguado, 
A tua Ausencia é a Virgem Dolorosa, 
Com tenebroso olhar no meu pregado. 

Ah! quanto a minha vida religiosa, 
Depois que te perdeste no sol-pôsto, 
Se fez incerta, fragil e enganosa! 

Em meu sêr desenhou-se um novo rôsto. 
Sou outro agora; e vejo com pavor 
Minha máscara interna de desgôsto. 

Vejo sombras á luz da minha dôr... 
Sombras talvez de eternas Creaturas 
Que vivem na alegria do Senhor... 

E quem sabe se os Mortos, nas Alturas, 
Vivem na paz de Deus, em sitios êrmos, 
Entre flôres, sorrisos e venturas?... 

E quem sabe se as dôres que soffremos 
E nosso corpo e alma, não são mais 
Que as suas vagas sombras irreaes?... 

Ah, nós sômos ainda o que perdemos... 

Teixeira de Pascoaes, in 'Elegias'

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